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A minha revolução

 

Resolvi fazer uma revolução e até já marquei o dia.

 

Claro que estou a preparar tudo muito cuidadosa e secretamente, porque, como quase todos podem imaginar, uma revolução não se faz nem maquinando-a sozinho fechado em casa, nem com meia dúzia de fiéis (?) amigos sentados à mesa do café, à vista e ao ouvido de toda a gente. Como bem compreendem não posso, nesta matéria, ir mais longe e entrar em maiores detalhes comprometedores.

 

Certamente que acham estranho que eu venha para aqui anunciar revoluções, arriscando-me a vê-las abortar logo à partida, como tem acontecido em muitas outras tentativas que não passaram de sonhos de gente, muita dela bem intencionada e sonhadora, que quase sempre se deixou ultrapassar pelos oportunistas que logo lhe passaram à frente, a calcaram e em breve tomaram as rédeas do poder.

 

Estou de acordo que, ainda não há muito tempo, cá se fez uma revolução que vai fazer anos no próximo dia 25 de Abril. Não há muito tempo é uma força de expressão, pois, na realidade, já lá vão uns trinta anos que, cada dia que passa, parecem cada vez mais longe dos propósitos de alguns revolucionários honestos e patriotas que a fizeram e a quem devemos para sempre ficar agradecidos.

 

Conquistou-se a Liberdade, (esta palavra devia sempre escrever-se com letra maiúscula), o que me permite vir para aqui dizer estas coisas sem correr o risco de ser engavetado, embora, por qualquer falha do sistema, possa a vir a ser preso preventivamente, não se sabe por quanto tempo nem por que motivo. No cômputo geral, valeu a pena mas, infelizmente, não temos razões, (nem dinheiro), para deitar mais um só foguete.  

 

Agora, quase tudo o mais que dela se esperava se vem esboroando e é o que se tem visto, num crescendo aterrador. Fez-se pouco, fez-se quase sempre mal e, o que é muito mais grave, com muito raras excepções, quase tudo o que se fez e vem fazendo é feito não só mal mas também, desculpem a indelicadeza, porcamente.

 

Corrupção passou a ser a palavra-chave com que se abrem todas as numerosas e demasiado largas portas do nepotismo, do descaramento, da hipocrisia, do compadrio, da traição, da roubalheira, enfim, de tudo o que cheire a podridão.

 

Esquecia-me de vos dizer que a nova revolução está marcada para o dia 29 de Fevereiro não vos digo, por razões mais que evidentes, de que ano. Com isso pretende-se poupar tempo e dinheiro com festarolas, medalhas, condecorações, feriados, pontes, peitos de peru recheados com tâmaras, discursos, deslocações, abraços, santolas, promessas vãs, camarões gigante, gabarolices, lagostas corpulentas, mentiras, paradas, bandas de música, linguados au Meunier, etc., etc.

 

Assim, é ponto bem assente que só de quatro em quatro anos, no dia 29 de Fevereiro, se fará por toda a parte uma festinha a nível paroquial, onde não vai haver aquela bagunça do costume, pagando, daí em diante, cada um o que come, o que bebe e as pequenas despesas de deslocação.

 

Vão ver como muita gente vai finalmente começar a aprender o que, de facto, significa a palavra Liberdade.     

 

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