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A sua majestade A Rainha Dona Isabel II

 

Buckingham Palace

London SW1

United Kingdom

 

 

Majestade,

 

Com a devida vénia me dirijo a Vossa Alteza por razões a que a consciência me impele e as circunstâncias me obrigam.

 

Estou em dificuldades com a linguagem pois embora lide, no dia a dia, com gente que traz o rei na barriga, com períodos de gestação extremamente longos, não tenho tido motivos que me levem a ter de me dirigir a tão altas Dignidades. Vai Vossa Alteza desculpar-me então dos deslizes de linguagem e protocolares que, por certo, vou cometer, embora eu vá buscar e rebuscar palavras arredondadas e macias, para evitar, longe de mim, plebeu ignoto, tal ousadia, beliscar ao de leve a Vossa Nobre e Excelsa figura.

 

Vossa Alteza não me conhece, creio eu, daí que eu acima me tenha adjectivado de ignoto. Mas, se fraqueza é de Vossa Majestade espreitar por detrás das cortinas, tendo eu tantas e tantas vezes estado especado em frente à Vossa casa em Londres, do lado de fora das grades, claro que, naturalmente, já terei sido notado pela minha pacovial insistência em rondar os Vossos Reais portões. E até me parece estar a ouvir Vossa Majestade dizer lá para dentro, ainda com a mão na cortina discretamente afastada: “Isn’t that the portuguese, down  there?”

 

Eu, por meu turno, não tive ainda o ansiado privilégio de ver Vossa Majestade ao vivo. Tenho os meus afazeres, Vossa Alteza sai pouco no Real coche, muito menos sai a pé, e daí que, apesar da minha insistência e estoicismo de Vos rondar a porta sempre que vou a Londres, não tenha tido a elevada honra de haver cruzado com Vossa Majestade.

 

A audácia desta minha missiva deve-se, não a razões de Estado mas, apenas a razões de consciência que me roeriam a mente e iriam afectar o meu próprio Estado de espírito se não as viesse aqui expor.

 

Vou imediatamente ao assunto para não fazer Vossa Majestade perder mais tempo. Imagino bem o trabalho que dá ter uma casa tão grande, ainda para mais com tanta porta e gente sempre a entrar e a sair por todas elas. Por mais que limpem os pés, eu sei bem o que isso é e só tenho uma porta, nunca se pode ter uma casa limpa.

 

Vai, então, Vossa Alteza permitir que eu entre no assunto que aqui me trouxe.

 

Durante anos a fio trabalhei, fiz que, contactei e lidei com súbditos de Vossa Alteza. Eu próprio, com muito orgulho o digo, era uma espécie de súbdito de Vossa Majestade a 50%. Não era, infelizmente, remunerado em Libras Esterlinas e, como os outros súbditos a meio corpo, era pago na moeda corrente de cá, demasiado corrente, diga-se, que é o Tostão a que alcunharam de Conto, que é uma abreviatura de Conto do Vigário. Em Portugal, o Conto do Vigário é uma actividade que cá dá muito tostão a quem possua arte persuasiva e perna ligeira.

 

Nos súbditos a 100%, venho dizer a Vossa Majestade nesta tão amarga hora de despedida, encontrei sempre gente extremamente afável, tratável, esmeradamente educada e de pronto e sadio humor, geralmente muito apurado. De muitos fiquei amigo e com todos me dei bem. Custa-me, digo-o do coração, vê-los partir!

 

Alteza! Era esta a singela mensagem que eu queria transmitir em mais este momento Histórico para as nossas Pátrias. Foi esta a razão do meu ímpar atrevimento.

 

Os meus mais sinceros votos das maiores felicidades e êxitos, para Vossa Majestade, seu Marido o Príncipe Consorte, toda a família Real e, “last but not least”, para todo o Vosso Irreal Povo.

 

 

Com veneração e mui respeitosamente,

 

A Bem das Nações,

 

Fin e Siza

 

 

 

 

 

 

*** Esta “carta” foi por mim escrita quando a ICI (Imperial Chemical Industries), deixou a FINICISA [FIN(os)+ICI+SA] e apenas ficou a parte portuguesa, os irmãos Fino, mantendo a fábrica o mesmo nome.

 

 A FINICISA, com o “know-how” ICI, começou em 1966 (eu entrei para os seus quadros em 1965) a fabricar fibras de poliéster e foi sempre aumentando a sua capacidade de produção, até que, em 1976, deu um grande salto e começou também a produzir polímeros de poliéster, para seu uso próprio e venda ao exterior. As matérias-primas basilares para  seu fabrico são o ácido teraftálico e o monoetilenoglicol que são importados.

 

 Fino é o nome duma família de industriais têxteis originários da Covilhã. Três irmãos Fino, (com características pessoais muito diferentes), Guy, Manuel e Francisco, homens de elevada "visão" empreendedores e corajosos que, em Portalegre, já eram donos da conceituada fábrica têxtil Francisco Fino, Lda., herdada de seu pai, e da espantosa Manufactura de Tapeçarias de Portalegre, à qual sempre esteve muito ligado o irmão mais velho, Guy. 

 

Embora a “carta” que escrevi seja aparentemente uma brincadeira, ela tem muito de verdade, e pretende homenagear todos os colaboradores britânicos (muitos ingleses, alguns escoceses e poucos galeses) de todos os níveis hierárquicos, com quem tive o enorme prazer de, lá dentro, trabalhar e, cá fora, viver agradáveis momentos de são convívio.

 

Sua Majestade a Rainha deu-me a honra de me responder numa outra “carta” que fica a morar aqui ao lado, para quem quiser conhecer a sua gentil resposta.  

 

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