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Fala um arrependido

 

Quando li a notícia das enormes e sofisticadas capacidades do novo Palácio de Justiça de Sintra, ainda a cheirar a tinta e a deixar, vindo de toda a parte, ouvir o som aterrador de inúmeros berbequins e as fortes pancadas de martelos indignados, fiquei exultante.


Um megaprocesso, desses muitos que andam para aí à solta, à revelia do tempo e ao acanhamento do espaço, foi para lá transferido. A Justiça começa a ter finalmente as mais elementares condições para ser feita de modo digno e, espera-se ansiosamente, muito mais lesto.


Só a sala de audiências do terceiro andar, onde esse tal processo se vai desenrolar nos próximos doze meses, tem um tamanho idêntico ao de um campo de andebol e está apressadamente (esta palavra, associada a coisas de Justiça, fazia sorrir até aqui qualquer sisudo a quem corre muito mal a vida) a ser mobilada com mesas e cadeiras para albergar de maneira adequada toda aquela enorme massa de gente que nele vai estar envolvida, desde os inúmeros julgadores, até à vasta turba de julgados, passando por todos os demais agentes de defesa e acusação, e acabando naquela mole imensa de gente directamente interessada no processo, sem esquecer os mais inocentes coscuvilheiros que não têm mais que fazer nem para onde ir e vão ser os primeiros a aparecer para terem um lugarzinho bem lá na frente.


A boa notícia ia quase ficar-se por aqui, quando um fugaz relâmpago se me atravessou o cérebro quase me fulminando de tardia vergonha e serôdio arrependimento.


Eu, afinal um bota-de-elástico perverso, que tanto criticara os magnificentes estádios, construídos teoricamente para se encherem durante o Euro 2004 e para praticamente estarem vazios após o referido evento, via agora quão curtas e estreitas haviam sido as minhas vistas.


Agora, sou esse mesmo eu quem, humildemente arrependido, mas fortemente motivado, vai mobilizar forças e vontades para que se façam mais estádios, muitos estádios, mais imponentes que os actuais, todos eles preparados para, num ápice, serem convertidos para receber os gigaprocessos que pairam ameaçadoramente nos ares sem terem espaço onde cair nem gente que os queira ou possa apanhar.

 

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      Os estádios de futebol e os mega processos em curso

 

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