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O caminho marítimo para a Europa

 

Nos tempos em que tínhamos um vasto império espalhado pelo mundo, enchiam-nos os ouvidos com ”slogans” do tipo ”Portugal não é um país pequeno”. E lá vinha um mapa ilustrar tal grandeza mostrando, ao lado da nossa verdadeira pátria, o vasto latifúndio que os nossos antepassados nos legaram e que Camões, tão empolgadamente em parte, cantou.

 

Ao contrário de outros povos, que se dedicaram quase exclusivamente ao jogo da caça ao tesouro, nós fomos dando novos mundos ao mundo, mas não tivemos nem o engenho nem a arte para, como eles e à grande, espremer e aproveitar o sumo do fruto que tivemos nas mãos.

 

Também não parecia ser esse o real propósito pois sempre se disse, candidamente, que íamos dilatar a Fé e o Império. Esses outros povos construíram países hoje civilizados, ricos e sobranceiros; nós continuamos confrangedoramente atrasados, rasteiramente pobres, sem um cêntimo a mais para mandar tocar uma só nota a um pobre músico de rua.

 

O que lá vai lá vai, e não vou eu agora sentir qualquer tipo de constrangimento pelo que fizemos ou deixamos de fazer. Não fiquem, porém, quaisquer dúvidas de que profundamente admiro e venero os nossos verdadeiros heróis e muito me orgulharia de saber acrescentar algumas estrofes à maior e talvez única e indestrutível, (apesar de vis tentativas), riqueza que da nossa aventura restou.

 

Ficou-nos, todavia, a incurável e sarnenta mania das grandezas. A igreja tem o mais alto campanário do mundo, a couve já passou o campanário, o maior lago artificial da Europa cobriu o campanário, a couve já apareceu à superfície do lago. Vamos construir um campanário, ainda mais alto, em cima da couve, ...

 

Muitas escolas e hospitais caem aos bocados e não cabe lá mais gente. Meia dúzia de gatos pratica desporto mas disseminam-se estádios faraónicos com capacidade para milhares de felinos adiposos. Os miúdos jogam no largo. Os velhos assistem, sentados no banco partido que não tem costas há dois mandatos.

 

Mas é preciso dotar os locais, onde vão nascer tão imponentes obras, de novos acessos, de sólidas infra-estruturas, afugentar a miséria e dar um empurrão nas iniciativas há tanto tempo encravadas que, se não fosse tão ambicioso projecto, iriam apodrecer no marasmo em que sempre viveram.

 

E quem paga? Desculpem, mas isso não é pergunta que se faça.

 

Se, aqui, as desamparadas gentes da raia alentejana resolverem comprar, por uns tempos para doca seca, um avantajado e moderno SGV, (Submarino de Grande Velocidade), para assim tornar imperiosa a abertura dum profundo e largo canal que cá traga as frias águas do Atlântico, arrastando consigo sardinhas e mexilhões e que lhes permita chegar a Lisboa em vinte minutos para ir ao tratamento ou à consulta da especialidade, alguém vai levar a mal?

 

Não se tratará apenas de mais uma corajosa e inédita iniciativa que engrandecerá não só a região mas todo o país global e, por tabela, toda a Europa central?

 

Já avaliaram a pressa com que os espanhóis iam prolongar o canal até Madrid e, numa já sobreposta empreitada, até Barcelona? E os franceses não começariam logo, de lá para cá e de cá para lá até Espanha, a construir, avisadamente, um canal de duas vias para terem ao dealbar, ainda a escorrer algas, lagosta, carapau e ostras ”portugaises”, ali, no coração de Paris?

 

 

 

***

       A nossa mania das grandezas chega a ser comovente

 

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