O segredo do negócio

 

Tenho um amigo que diz ter um curso superior. Eu sei que ele não tem curso nenhum, pois ainda lhe devem faltar pavilhões e pavilhões de cadeiras muito mal amontoadas; e superior ainda menos, pois ele, que sempre andou comigo, muito mal e com algum custo, apenas o nono ano conseguiu tirar.

  

Em casa a mulher (ele diz sempre “a minha esposa”) trata-o por Beto e, como à mulher-a-dias (eles dizem “a ucraniana”) disseram para o tratar por senhor doutor, todo o prédio, de alto a baixo, começou a tratá-lo assim.

 

Eu tratava-o por Alberto, ele batia-me familiarmente nas costas e chamava-me colega, dizendo, logo que podia, a toda a gente que eu era doutor e que tinha andado a estudar com ele. Num efeito a que já ouvi chamar alastrativo, hoje toda a gente lhe chama doutor e eu, por tabela, com o meu décimo segundo feito a martelo, também doutor sou.

 

Ele vive muito bem não se sabe de quê, e eu, apesar de ser comprovadamente tanto ou mais doutor do que ele, vivo muito mal e sei porquê.

 

Encontrámo-nos, por acaso, um destes dias na rua. Chamei-lhe em voz alta, como ele gosta e quer, doutor; bateu-me nas costas, “eh pá, estás bom?!”, e conversámos uns bons momentos sobre as nossas vidas. Eu, como de costume e sem pessimismo, lamentei-me da minha, e ele, cheio de optimismo, gabou-se da sua que vai às mil maravilhas e é um tal entrar.

 

Ainda não sei bem o que ele faz, mas vi que deve ser bem chorudo o negócio quando, a certa altura da conversa, sem esconder a vaidade, me disse que já dera ordens lá na firma para que ninguém trabalhasse durante os jogos para o Europeu 2008 de futebol em que entrar a nossa equipa, mais todo o resto do que ali possa vir a interessar ao povo português.

 

O negócio pode ser muito bom, mas não tenho a menor dúvida que é na produtividade que deve estar o grande segredo.

 

Ele não me diz, mas eu acho!

 

 

 

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Uma empresa qualquer vai dispensar o pessoal  que queira ver pela TV os jogos do Euro 2008 onde entra a equipa portuguesa.