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Os venerandos bonecos

 

Antigamente, os Presidentes da República eram todos venerandos. Nas cerimónias oficiais, usavam a sua bem engalanada farda e, quando outros a eles se referiam, chamavam-lhe o Venerando Chefe de Estado.

 

Eram escolhidos com dedo firme para, depois, em farsas muito bem ensaiadas, serem “eleitos” para tripular um barco que os próprios sabiam de antemão não ter remos, nem leme, nem rumo que eles tivessem sequer de esboçar.      

 

O mais importante da sua tarefa era não fazer ondas. Venerandamente, cortavam fitas, iam nas procissões, beijavam criancinhas e faziam discursos mornos e curtos, todos iguais, adaptados às circunstâncias. Outros cuidadosamente lhos escreviam e colavam no verso da gravata para que eles a fossem desenrolando disfarçadamente à medida que os soletravam depois da lauta refeição com que terminavam todas as cerimónias.  

 

Pelo meio, batiam-se efusivas palmas, (ai de quem não as batesse, com um enorme brilho a cintilar nos olhos), sob a batuta duma claque possessa e luzidia, espalhada estrategicamente pelas mesas, que se ejectava das cadeiras nos pontos cruciais da lengalenga intragável de que conheciam o texto de cor e salteado.

 

No tão ansiado fim, os aplausos atingiam o rubro e gritava-se, em jactos e em delírio, o nome do oculto timoneiro que todos exuberantemente mostravam adular e recatadamente escondiam temer.

 

Parece que era assim que muitos queriam que isto voltasse a ser, não parece?!  

 

 

  

***

     O Presidente da República (eleito) Aníbal Cavaco Silva e o Estatuto dos Açores

 

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